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Polêmica: concurso púlbico da Marinha é alvo de denúncia

Levar o navio para dentro do porto não é tarefa do capitão. É do prático, profissional com salário de até R$ 130 mil por mês. As poucas vagas de prático são muito cobiçadas, e o último concurso virou um festival de denúncias. Uma delas trazida à redação do “Jornal da Globo” por um telespectador. A reportagem é de Vladimir Netto.

 O prático entra em cena numa pequena lancha, que encosta no navio na entrada do porto. O capitão, depois da longa viagem, não faz mais nada, apenas observa. Na cabine de comando, é o prático que dá ordens agora. Fica de olho no movimento do porto, na maré, no vento, verifica instrumentos, faz cálculos, passa orientações.

 Aos poucos, ele vai movendo o enorme navio até que ele pare no cais sem nenhum arranhão. Concluído o trabalho, o prático recebe o pagamento e vai embora.

 Manobrar um navio grande como esse não é fácil. É um trabalho que exige muita habilidade e um profundo conhecimento técnico. Mas paga bem. Em um porto movimentado como o do Rio de Janeiro, um prático pode ganhar até R$ 130 mil por mês.

 E aí é que começa a briga. Não existe um curso ou uma faculdade privada para formar práticos. A única maneira de ingressar na carreira é passar em um concurso público organizado pela Marinha, que regulamenta a profissão.

 O último concurso para aprendiz de prático aconteceu em setembro do ano passado, no Rio de Janeiro. Os aprovados fariam um estágio de dois anos em empresas de praticagem.

 

 

Denúncias

Candidatos reprovados denunciam o que consideram irregularidades cometidas para favorecer pessoas ligadas ao Conselho Nacional de Praticagem, o sindicato da categoria. O Ministério Público abriu uma investigação e apontou indícios de quebra de sigilo da prova.

 Um candidato conta que na sala onde ele estava, quando os envelopes foram abertos, faltavam dez cadernos de questões. Os candidatos protestaram, mas a prova foi mantida e nada foi registrado em ata.

 “Acho que deveria ter parado. Qualquer concurso sério, surgiu fumaça tem que parar. Alguma coisa não está certa. Diante dos eventos e das coisas que ocorreram, acredito que tenha alguma coisa sim. Acredito que tenha tido fraude”, disse o candidato reprovado Albino Belon.

 Uma outra prova foi encontrada rasgada no banheiro dos fiscais. No depoimento ao Ministério Público, a fiscal Gisele de Oliveira disse que estava olhando uma das provas quando passou mal e correu para o banheiro. E só quando estava lá, percebeu que tinha levado a prova sem querer. Em desespero, segundo ela, tentou jogar a prova no vaso, mas ele estava entupido. Aí, jogou tudo no lixo e fugiu.

 “É interessante notar que foi uma prova inteira, prova do concurso, a primeira página tava rasgada. Se não tinha a identificação de quem era. A fiscal que viu essa prova não foi ouvida na sindicância que a Marinha fez”, argumenta o candidato reprovado Ricardo Bravo.

 Questões anuladas e gabarito alterado

E tem mais, de acordo com o Ministério Público, cinco questões foram anuladas e duas tiveram o gabarito alterado sem justificativa, o que mudou a lista de aprovados. Na ação civil pública, o procurador do caso lista o nome de cinco candidatos aprovados que são parentes de membros do Conselho Nacional de Praticagem.

 “Sem sombra de dúvida, o pedido do Ministério Público Federal é para anular o concurso por conta da quantidade de irregularidades nele ocorrida”, afirma o procurador da República, Edson Abdon .

 Revolta dos aprovados

A ação provocou a ira dos aprovados, que reagiram. Dizem que muitos outros filhos de práticos não passaram. E que todas as acusações são na verdade uma tentativa de virar o jogo no tapetão.

 

“As denúncias não se sustentam. aquele banheiro era de uso exclusivo dos fiscais da prova, da organização da prova. E no momento em que foi encontrada a prova e que essa fiscal levou essa prova para o banheiro todos os candidatos já tinham posse dos seus cadernos de questões”, pontua o candidato aprovado Luiz Carlos Gomes Junior.

 “Acho que existe aí uma corrida por fatos, quaisquer que sejam os fatos para tentar conseguir uma nova oportunidade”, fala o candidato aprovado José Augusto Santana Martins.

 A reportagem tentou falar com o prático Marcelo Cajaty, mas ele não quis dar entrevista. Marcelo é prático há mais de 20 anos e atual presidente do Conselho Nacional de Praticagem. Ele teve dois filhos aprovados no concurso, em segundo e quarto lugares. Um deles, Guido Cajaty, que ficou em quarto, diz que não teve acesso a informações privilegiadas e que não recebeu qualquer tipo de favorecimento.

 “Estudei muito tempo, passei por mérito, não houve favorecimento”, afirma Cajaty.

 A Marinha não quis gravar entrevista. Disse, em nota, que investigou as denúncias e não encontrou irregularidades. A Justiça Federal suspendeu o concurso, que teria o resultado homologado na quarta-feira. Até essa data a Justiça e o Tribunal de Conta da União, que também investiga o caso, decidem se o concurso será anulado.

 G1

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