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Vilões da saúde, cigarro e bebidas são ‘curingas’ da Receita

A chegada da crise mundial levou o governo, desde o ano passado, a reduzir impostos sobre diversos produtos para dar mais impulso à economia.

 

Cobriu de um lado, descobriu do outro: a arrecadação de impostos começou a minguar e, só nos dois primeiros meses do ano, desabou quase 10%.

Então, na semana passada, quando mais medidas de desoneração foram anunciadas, o governo decidiu “esticar” o cobertor, elevando as alíquotas do IPI e do PIS/Cofins dos cigarros. A aposta agora é que as bebidas também terão seus impostos elevados.

A prática de onerar esses setores em “momentos de dificuldade” não é nova. Já no ano passado, membros do governo defenderam o aumento da cobrança de tributos sobre bebidas e cigarros como forma de compensar a perda de arrecadação sofrida pela extinção da Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF).

Cigarros e bebidas são ‘alvos’ preferenciais nesse tipo de equação. Além de ajudar a encher o cofre, a elevação de impostos sobre esses produtos gera menor reação da opinião pública, já que leva o carimbo de uma ação em benefício da saúde pública.

“Como são setores em que há um elevado consumo, cobrar mais tributos (dos mesmos) é uma estratégia de arrecadar de maneira mais rápida. Eles arrecadam valores significativos, mas também não é uma galinha de ovos de ouro”, explica Gilberto Luiz do Amaral, presidente do Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário (IBPT).

“Isso é histórico. Parece que produtos considerados supérfluos, que têm essa característica, são os primeiros que vêm na cabeça de qualquer um”, diz, Ênio Rodrigues, superintendente do Sindicato Nacional da Indústria de Cerveja (Sindicerv).
Saúde pública

De acordo com estudo do economista Roberto Iglesias para o Banco Mundial, um aumento de 10% no preço do cigarro leva a uma queda de 2,8% no consumo per capita em um prazo de três trimestres. “Com esse aumento de agora, o consumo per capita pode cair até 8% daqui a nove meses”, avalia.

Com efeitos positivos para a saúde pública, aumentar impostos para esses setores provoca, em geral, pouca reclamação. “É um avanço. Qualquer aumento é bem vindo. É o tipo da medida que é bom para os dois lados”, diz Paula Johns, diretora executiva da Aliança de Controle do Tabagismo (ACT).

“É comprovado através de vários estudos que o aumento dos preços é uma política eficaz para o controle do tabagismo. Evita principalmente que os jovens tenham acesso ao cigarro”, diz Valeria Cunha, técnica da divisão de controle do tabagismo do Instituto Nacional do Câncer (Inca).

Mesmo a indústria é cautelosa na hora de reclamar. “Em relação à decisão de aumentar os impostos, não nos opomos a aumentos razoáveis”, diz Guilherme Athia, diretor de assuntos corporativos da Philip Morris, uma das duas grandes fabricantes de cigarros no Brasil.

“A posição do Sindifumo é de concordância com o aumento das alíquotas”, diz José Henrique Barreto, presidente da entidade que representa os fabricantes de cigarro no estado de São Paulo.

Ainda está barato

De acordo com o presidente do IBPT, Gilberto Amaral, cigarros e bebidas são hoje os produtos mais taxados do mercado. No caso do fumo, impostos e tributos respondem por até 80% do preço final. Para as bebidas, esse percentual pode chegar a 81%.

Ainda assim, o tabaco brasileiro é o sexto mais barato do mundo.

 

“Acho que, no médio prazo, deveria ser em torno de R$ 10”, defende Paula Johns. “Apesar de toda a taxação que o produto do tabaco tem no Brasil, nosso cigarro continua sendo barato”, concorda Valéria, do Inca.

A crítica, aqui, é por uma política mais ampla de combate ao tabaco. “Acho que há um problema de receita e escolheram esse setor muito parcialmente (para elevar impostos), mas corretamente. E isso ajuda na redução do consumo. Mas o governo tem outras políticas para controlar a epidemia do tabagismo. A tributária está mal encaminhada”, diz Roberto Iglesias.

A diretora da ACT também pede mais ações: “acho até natural tratar (o aumento de impostos) mais como bengala do que como política de combate ao fumo. O que acho que deveria melhorar é a relação entre Receita Federal e Ministério da Saúde”.

 

Aumento da ilegalidade

Para os fabricantes, a maior crítica com relação ao aumento de tributos é que ele estaria tirando empresas do mercado formal.

“Teoricamente seria mais fácil cobrar da gente. Mas na verdade não é assim, você acaba empurrando gente para a informalidade”, diz Ênio Rodrigues, do Sindicerv.

 

“Numa visão simplista, o governo pode aumentar um pouco (os impostos) aqui achando que vai aumentar (a arrecadação), mas é um erro grosseiro”, afirma.

“Como a indústria de cigarros já opera com alta carga de tributos, tais aumentos poderão contribuir para o incremento do já elevado patamar de ilegalidade existente no mercado de cigarros”, diz a Souza Cruz em nota.

 

Segundo a empresa, o contrabando e a sonegação no setor provocam prejuízo anual de mais de R$ 1,8 bilhão aos cofres do governo.

Para Roberto Iglesias, no entanto, a relação entre alta de impostos e ilegalidade não é tão direta.

 

“O que a gente sabe é que a Receita, no passado, baixou o IPI com o intuito de diminuir o contrabando. E o contrabando se manteve mais ou menos na mesma proporção do consumo total. E, por outro lado, em 2006, 2007, a Receita aumentou os preços e o contrabando até que caiu um pouco. O volume não parece estar tão diretamente associado à redução dos impostos em preços reais. Tem a ver com aplicação da lei, com repressão policial, possibilidade de controlar fronteiras”.

 

G1

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