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Toffoli nega censura e diz que houve tentativa de constranger o Supremo

O presidente do Supremo Tribunal Federal, Dias Toffoli, rechaçou, em conversa com o Valor, a tese de que o STF censurou a revista "Crusoé" e o site "O Antagonista". Segundo o ministro, os veículos de imprensa orquestraram uma narrativa "inverídica" para constranger e emparedar o Supremo às vésperas de a Corte tomar uma decisão sobre a prisão após o julgamento em segunda instância. "É ofensa à instituição à medida que isso tudo foi algo orquestrado para sair às vésperas do julgamento em segunda instância. De tal sorte que isso tem um nome: obstrução de administração da Justiça."

O julgamento no Supremo estava agendado para o dia 10, mas foi retirado de pauta seis dias antes. A matéria que teve a leitura no site interditada foi postada há uma semana, bem depois, portanto, de o STF alterar sua agenda.

Toffoli sugeriu haver vínculo entre a agenda do Supremo e a reportagem da revista digital, que relatava um esclarecimento que Marcelo Odebrecht prestou à Polícia Federal, no âmbito do inquérito da Lava-Jato em Curitiba. O empreiteiro, que fez acordo de delação premiada, foi instado a explicar codinomes que apareciam em e-mails apreendidos em seu computador, sendo um deles "o amigo do amigo de meu pai". A explicação de Odebrecht foi anexada aos autos no dia 9 de abril. O julgamento do STF seria no dia 10. No documento enviado pelo delator, ele diz à PF que "o amigo do amigo de meu pai" era Dias Toffoli. Essa mensagem eletrônica de Odebrecht foi enviada ao departamento jurídico da empresa, aos executivos Adriano Maia e Irineu Meireles. Para o ministro, o documento "não diz nada com nada". "Daí tirem as suas conclusões. Era exatamente para constranger o Supremo", reitera Toffoli, que ressalta: "Quando eu era ministro, sem ser presidente, nunca entrei com ação [contra uma publicação], nunca reclamei. Mas agora é uma questão institucional. Ao atacar o presidente, estão atacando a instituição."

Toffoli argumentou que a Constituição veda a censura prévia. "Se você publica uma matéria chamando alguém de criminoso, acusando alguém de ter participado de um esquema, e isso é uma inverdade, tem que ser tirado do ar. Ponto. Simples assim." Na visão do ministro, há veículos de comunicação vinculados a interesses econômicos, e não jornalísticos. "Tem que lembrar quem financia esses sites. Isso não é imprensa livre. É imprensa comprada."

A revista e o site foram procurados pelo Valor. Um dos sócios, Mario Sabino, enviou por escrito a resposta: "O Antagonista e a Crusoé não aceitam receber nenhum patrocínio estatal, inclusive na forma de anúncios. Também não recebem mesada. O Antagonista sobrevive principalmente por meio de publicidade de empresas privadas, via mídia programática. Uma pequena parte da nossa receita é obtida por meio da propaganda da nossa sócia, publicadora de relatórios financeiros. Divulgamos isso quando firmamos a sociedade, o que levou a que inventassem que 'especulamos com a notícia'. A Crusoé vive exclusivamente da venda de assinaturas. Somos uma empresa saudável e podemos abrir as nossas contas sem necessidade de inquéritos inquisitoriais".

Sabino acrescentou o seguinte: "Dias Toffoli não está imune a processo por calúnia. O único constrangimento causado ao Supremo se dá pelo comportamento abusivo do censor Dias Toffoli, que está abolindo o devido processo legal, com o seu inquérito inconstitucional".

O ministro associou a atuação agressiva nas redes sociais contra instituições e agentes públicos a interesses internacionais, sem especificá-los. "A destruição das instituições e de reputações faz parte de uma campanha de ódio. Temos que saber se não há interesses internacionais por trás disso, de desestabilizar as instituições. Interesses nada republicanos."

Toffoli minimizou o impacto do episódio na relação do Supremo com a Procuradoria-Geral da República, uma vez que a procuradora, Raquel Dodge, determinou o arquivamento do inquérito aberto por ele para apurar a rede de "fake news" que promoveria ataques ao STF. O presidente do Supremo fez questão de enfatizar as qualidades profissionais de Dodge, a quem se referiu como "um dos quadros mais qualificados de todo o Ministério Público". Porém, ressalvou que a procuradora-geral não tem prerrogativa para tomar decisão neste caso: "A PGR opina, dá parecer. Quem decide é a magistratura, é o Poder Judiciário."

O ministro assegurou que o conflito entre Supremo e PGR não chegará ao pleno da corte. "Não, de maneira nenhuma. Isso daí está tudo tranquilo. A Raquel Dodge é uma excelente procuradora-geral da República, uma pessoa qualificadíssima", enfatizou. Como terminará o imbróglio, segundo ele, "só o tempo dirá".

Toffoli citou inúmeras decisões já tomadas pelo STF para enfatizar que a instituição não corrobora com a censura. O caso mais emblemático, de acordo com o ministro, foi o julgamento, em 2003, do editor de livros nazistas, Siegfried Ellwanger, condenado por racismo ao negar a existência do holocausto. Por decisão judicial, os livros foram retirados de circulação. "É necessário mostrar autoridade e limites. Não há que se falar em censura neste caso da 'Crusoé' e do 'Antagonista'", reiterou.

A revista, na ocasião da reportagem, encaminhou um pedido de manifestação ao ministro. Ele se negou a responder e justificou: "Me manifestar sobre uma inverdade? É tudo inverdade". Dias Toffoli disse não se lembrar se trocou e-mail diretamente com a área jurídica da Odebrecht.

A reportagem dizia que no e-mail enviado por Marcelo Odebrecht a Adriano Maia, diretor jurídico da empreiteira, ele cobrava informações sobre um contato com a Advocacia-Geral da União (AGU) sobre o projeto de hidrelétrica do rio Madeira. Toffoli, à época, era advogado-geral. "Eu sinceramente nem me lembro. Isso foi 12 anos atrás. Todo mundo que me procura eu atendo. São dezenas de pessoas por dia. Sempre fui assim. Atendia na AGU, atendia na Subchefia de Assuntos Jurídicos", alegou. O presidente do STF enfatizou que todas as obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) foram acompanhadas pela AGU, e que os interesses da Odebrecht, especificamente neste caso, foram contrariados. Segundo o diretor da revista, Rodrigo Rangel, a reportagem "descreveu o teor de um documento constante dos autos da Lava-Jato, contextualizando as informações nele contidas, sem fazer juízo de valor".

 

Valor
Foto: Fabio Rodrigues Pozzebom / Agencia Brasil

 


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