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Opinião: de “bandido bom é bandido morto”, a “jornalista bom é jornalista morto”

Depois de muito refletir sobre como tratar deste assunto, de tudo o que pensei, o que mais ecoou na minha cabeça foi a conclusão de que, em primeiríssimo lugar, tenho que manter a relação de honestidade com esta meia dúzia de leitores.

Para manter este compromisso de pé, devo dizer aos meus seis leitores que não vou atacar o empresário Roberto Cavalcanti. Por uma razão simples e obvia: ele foi meu patrão por quase quarenta anos e pelos corredores do Sistema Correio de Comunicação, do qual ele é dono, passei mais tempo do que em minha própria casa.

O “doutor Roberto”, como nós o tratamos, sempre manteve comigo uma relação cordial e, mesmo sendo dono da emissora, jamais censurou-me quando fazia o contraponto no radiofônico Correio Debate. Ao lado de Heron Cid e Fabiano Gomes, ali defendi pontos de vista que, com toda certeza, contrariou os interesses da empresa, dos seus dirigentes e, de modo muito especial, do doutor Roberto.

É verdade que, em alguma dessas ocasiões, o doutor Roberto chegou aos estúdios da emissora – como fazia todo o dia – trombudo e notoriamente irritado. Geralmente, sentava-se à bancada, fazia seu comentário no ar, opondo-se àquilo que eu havia dito, mas, justiça se faça, nunca me proibiu de dizer o que pensava: “Fique à vontade. Você está cumprindo o seu papel”.

Mesmo depois de eu haver pedido demissão do Sistema Correio, por livre e espontânea vontade, Roberto Cavalcanti continuou a me dispensar a mesma atenção de sempre. Quinze dias depois de eu haver saído do Sistema, ele me ligou, ao voltar de uma viagem, para conversar sobre a minha querida Serraria. De lá para cá, quando preciso, nos comunicamos.

A última mensagem que recebi do doutor Roberto pelo Whatsapp, data do último dia 8: “Se cuide. Se precisar de alguma coisa é só me falar”.

Para o leitor de bom senso, imagino que fica mais do que claro que não seria eu a proferir qualquer ataque à pessoa do senhor Roberto Cavalcanti.

Discordando

Também estaria quebrando compromisso de honestidade com os meus minguados leitores, se não dissesse que discordo completamente da infeliz declaração do doutor Roberto, ao se referir aos profissionais de imprensa que, diariamente, divulgam o chocante número de mortos pelo coronavírus no Brasil: “Um jornalista, um radialista que fizesse um negócio desses, devia ser apedrejado na rua”.

Ao proferir essas palavras, ele, sequer, se deu conta de que estaria pondo em perigo os seus próprios funcionários, que compõem o maior Sistema de Comunicação do Estado.

Sinal de alerta

As declarações do doutor Roberto se enquadram num cenário perigoso, no qual figuram profissionais da comunicação. No Brasil de hoje, sair à rua ostentando coletes de imprensa ou gravador, bloco e caneta, está passível até de morte.

O que o doutor Roberto afirmou, pelo menos entre nós, acendeu o sinal de alerta para o momento extremamente perigoso porque passa a imprensa brasileira.
Este cenário de risco para uma das profissões mais essenciais da sociedade, sobretudo numa pandemia, tem tudo a ver com a postura hostil do presidente Jair Messias Bolsonaro, com relação à imprensa. Quem acompanha o noticiário, já viu agressões públicas do presidente a jornalistas que cobrem as atividades do Palácio do Planalto, inclusive, com gritos de “cale a boca”, procedimento próprio dos governantes totalitários.

Na quarta-feira (13), um jornalista havia sido morto a tiros em Araruama, no Rio de Janeiro: Leonardo Pinheiro, de 39 anos, fazia uma entrevista quando homens que estavam num carro se aproximaram e efetuaram os disparos.

Em várias outras regiões do país, tornou-se rotina as ameaças aos jornalistas, às vezes dentro do próprio veículo de comunicação, às vezes na rua. Aos poucos, vai se construindo a falsa ideia de que o coronavírus, que já matou milhares de pessoas em todos os quadrantes do planeta, é mais um exagero da imprensa do que propriamente o fato incontestável que é.

Aqui mesmo na Paraíba, não tem sido raros os casos de agressões verbais ou de simples acusações a jornalistas por parte de autoridades. O lamentável é que, nem sempre, os acusadores dão nome aos bois, tampouco, provam o que dizem.

Novos bandidos

Uma parte considerável da imprensa brasileira, inclusive na Paraíba, é partidária da máxima idiota segundo a qual “bandido bom é bandido morto”.
A propósito, a coluna transcreve abaixo, trecho da coluna da jornalista Tereza Cruvinel, sob o titulo “Pichação fascista em BH: ‘Jornalista bom é jornalista morto’, e que tem tudo a ver:

“O fascismo avança. Se não reagirmos, eles passarão”, escreve a jornalista Tereza Cruvinel sobre a pichação encontrada na avenida Alfredo Balena, em Belo Horizonte”.

Estranho

Apesar do retorno estimulante que essa modesta coluna recebe dos seus leitores, seja por telefone, por e-mail ou whatsapp, nas últimas horas recebemos inúmeras “cobranças” sobre o que iríamos dizer acerca das declarações do doutor Roberto Cavalcanti.

O curioso é que, algumas dessas figuras, que jamais sugeriram qualquer tema à coluna, e embora tenham espaço na imprensa, blogs e mídias sociais, não escreveram uma linha a respeito, ou seja: provocam os outros, mas se acovardam.

Não é bem assim que ajuda a construir democracia…

 

Wellington Farias

PB Agora

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