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Desembargador libera parcialmente eventos de campanha em Remígio

Em decisão tomada nesta sexta-feira (2), o desembargador Joás de Brito Pereira Filho deferiu parcialmente liminar permitindo a realização de atos de campanha eleitoral no município de Remígio, no Agreste paraibano. Porém, de acordo com a decisão, os eventos devem ter número de participantes compatível com o distanciamento social como forma de prevenir a contaminação pelo novo coronavírus, assim como, nesses eventos, deverão ser cumpridas todas as medidas sanitárias estabelecidas pelos órgãos competentes.

O pedido foi feito através de mandado de segurança de autoria do Partido Progressistas (PP) de Remígio, liderado pelo candidato a prefeito Cláudio Régis, em contraponto a Portaria da 67ª Zona Eleitoral da Paraíba, que restringe a propaganda eleitoral.

Confira decisão do desembargador Joás de Brito Pereira Filho:

DEFIRO PARCIALMENTE A LIMINAR para permitir a realização de reuniões políticas cujo número de participantes fica adstrito ao que o ambiente ensejar com a garantia do distanciamento social recomendado, mantidas as demais proibições.

Registro, por importante, que a concessão parcial da liminar não implica no desatendimento às medidas sanitárias de proteção definidas pelos órgãos e autoridades competentes, além de todas as demais cautelas exigidas nos protocolos municipais e estaduais de prevenção à contaminação pelo COVID-19, a exemplo da utilização de ambientes que garantam o distanciamento social com espaço mínimo e privativo de 2m² por pessoa, com controle de acesso, devendo ser fornecido/ exigido todo o aparato de higienização, bem como uso de máscaras por todos os participantes, com vistas à preservação da saúde de todos os envolvidos e da população em geral.

Confira abaixo a íntegra do relatório elaborado pelo desembargador:

DECISÃO LIMINAR
RELATÓRIO

O PARTIDO PROGRESSISTAS, por seu Diretório Municipal em Remígio, impetrou Mandado de Segurança com pedido de liminar contra ato praticado pela Juíza da 67ª Zona Eleitoral – Remígio-PB.

Aduziu que a Autoridade Apontada Coatora baixou a Portaria nº 26/2020, restringindo amplamente a propaganda eleitoral e consignando que seu descumprimento importará crime de desobediência.

Sustentou que subsiste direito líquido e certo ao exercício da propaganda eleitoral pelo Impetrante e seus filiados, traduzindo-se o ato combatido em amarra ao desenvolvimento do pleito eleitoral.

Acrescentou que o município de Remígio encontra-se em situação de controle epidemiológico da Covid-19, contando em – 29/09/2020 – com apenas 20 casos ativos da doença, de um total de 283 confirmados em todo o período, o que representa pouco mais de 1% de sua população total.

Defendeu o cabimento do Mandado de Segurança, nos termos da Constituição Federal e a competência desta Corte para apreciá-lo, porquanto o ato foi emanado de juiz eleitoral, conforme dispõe o artigo 24 do RITRE/PB.

Alegou que a portaria é desarrazoada e excede o poder de polícia, transbordando a competência jurisdicional e atribuições previstas no Código Eleitoral.

Disse que o tolhimento ao direito do Impetrante não apenas viola o princípio da proporcionalidade, como também outros princípios aplicáveis à propaganda eleitoral, como o princípio da legalidade, igualdade, e principalmente o da liberdade.

Discorreu sobre a Consulta respondida por este Regional em julgado recente, argumentou que os requisitos legais estão presentes e pediu a concessão da medida liminar para suspender os efeitos do ato apontado coator (Portaria nº 26/2020), com vistas a possibilitar a realização de atos de propaganda eleitoral com respeito e observância dos protocolos de segurança sanitária.

No mérito, requereu a concessão da ordem para anular a Portaria nº 26/2020, permitindo-se a realização de propaganda eleitoral, com a observância do protocolo sanitário relacionado à proteção contra a Covid-19.

Processo Judicial Eletrônico recebido em 01/10/2020, às 18h19min.

É o sucinto relatório. DECIDO.

Inicialmente, registro o cabimento de Mandado de Segurança no caso vertente, porquanto manejado contra ato expedido em poder de polícia contra o qual, a princípio, não há recurso apropriado com efeito suspensivo.

O artigo 1º da Lei nº 12.016/09 estabelece que será concedido mandado de segurança para proteger direito líquido e certo, não amparado por habeas corpus ou habeas data, sempre que, ilegalmente ou com abuso de poder, qualquer pessoa física ou jurídica sofrer violação ou houver justo receio de sofrê-la por parte de autoridade, seja de que categoria for e sejam quais forem as funções que exerça.

Em apertada síntese, insurge-se o Impetrante contra a Portaria nº 26/2020 subscrita pela Juíza da 67ª Zona Eleitoral sediada em Remígio-PB, cujo artigo 1º está assim redigido:

Art. 1º Ficam proibidos atos de propaganda eleitoral que ensejem grande aglomeração de pessoas, tais como comícios, carreatas, caminhadas, passeatas ou reuniões com aglomerações de pessoas por parte de candidatos, representantes de partidos ou de coligações e de eleitores em atos de campanha eleitoral, nos Municípios de Remigio/PB e Barra de Santa Rosa/PB, integrantes da 67ª Zona Eleitoral enquanto estes não se enquadrarem na bandeira verde, conforme os termos da classificação dos municípios do Estado da Paraíba em quatro estágios, adotada pelo Decreto Estadual n°. 40.304/20.

Conforme se infere do teor da Portaria (ID 4001247) estabeleceu-se a vedação de praticamente todos os atos de propaganda e campanha eleitoral de rua durante o período eleitoral, ou até que os municípios integrantes da 67ª Zona atinjam a bandeira verde1.

A Emenda Constitucional nº 107, que alterou a data das eleições, em razão da crise de saúde representada pela COVID-19, assim dispôs:

Art. 1º As eleições municipais previstas para outubro de 2020 realizar-se-ão no dia 15 de novembro, em primeiro turno, e no dia 29 de novembro de 2020, em segundo turno, onde houver, observado o disposto no § 4º deste artigo.

(…)

§ 3º Nas eleições de que trata este artigo serão observadas as seguintes disposições:

(…)

VI – os atos de propaganda eleitoral não poderão ser limitados pela legislação municipal ou pela Justiça Eleitoral, salvo se a decisão estiver fundamentada em prévio parecer técnico emitido por autoridade sanitária estadual ou nacional;

Por seu turno, a Nota Técnica2, que trata de recomendações complementares para as Eleições 2020, estabelece:

A Secretaria de Estado da Saúde da Paraíba vem ratificar e complementar, considerando todas as recomendações já propugnadas pelo protocolo referente às Eleições Municipais de 2020, o que segue:

I. As recomendações do referido protocolo, bem como os complementos apresentados nesta Nota Técnica, aplicam-se, em sua totalidade, a todos os 223 (duzentos e vinte e três) municípios do Estado da Paraíba, independentemente de sua classificação de bandeiras (verde, amarela, laranja ou vermelha) no Plano Novo Normal;

II. Ratifica-se que atividades presenciais relacionadas às campanhas eleitorais devem ser evitadas o quanto possível; contudo, uma vez mantidas as opções por sua realização estas deverão ocorrer de forma a garantir o uso constante de máscaras, as condições para lavagens das mãos, além da manutenção do distanciamento social, como já recomendado pelo referido protocolo para as Eleições 2020 disponível no link: https://paraiba.pb.gov.br/diretas/saude/coronavirus/arquivos/as-eleicoesmunicipais-2020-1.pdf

III. Para que se possa garantir o distanciamento social proposto recomenda-se que nos ambientes destinados às referidas atividades seja demarcado e respeitado espaço privativo mínimo de 2m² (dois metros quadrados), por pessoa, o que se refletirá na definição da capacidade máxima de pessoas para o referido ambiente, mantendo-se todas as demais recomendações previstas, conforme protocolo proposto por esta Secretaria de Estado;

IV. Recomenda-se também a não realização de atividades presenciais tais como comícios, carreatas e passeatas, uma vez que estas promovem grandes aglomerações de pessoas, que indubitavelmente colocarão seus participantes em risco objetivo de infecção pela COVID-19 e seus agravos à saúde.

A Resolução TSE nº 23.610, que dispõe sobre propaganda eleitoral, assevera:

Art. 6º A propaganda exercida nos termos da legislação eleitoral não poderá ser objeto de multa nem cerceada sob alegação do exercício do poder de polícia ou de violação de postura municipal, casos em que se deve proceder na forma prevista no art. 40 da Lei nº 9.504/1997(Lei nº 9.504/1997, art. 41, caput).

§ 1º O poder de polícia sobre a propaganda eleitoral será exercido por juízes eleitorais e juízes designados pelos tribunais regionais eleitorais, nos termos do art. 41, § 1º, da Lei nº 9.504/1997, observado ainda, quanto à internet, o disposto no art. 8º desta Resolução.

§ 2º O poder de polícia se restringe às providências necessárias para inibir práticas ilegais, vedada a censura prévia sobre o teor dos programas e das matérias jornalísticas a serem exibidos na televisão, na rádio, na internet e na imprensa escrita (Lei nº 9.504/1997, art. 41, § 2º).

Art. 13. A realização de qualquer ato de propaganda partidária ou eleitoral, em recinto aberto ou fechado, não depende de licença da polícia (Lei nº 9.504/1997, art. 39, caput).
§ 1º O candidato, o partido político ou a coligação que promover o ato fará a devida comunicação à autoridade policial com, no mínimo, 24 (vinte e quatro) horas de antecedência, a fim de que esta lhe garanta, segundo a prioridade do aviso, o direito contra quem pretenda usar o local no mesmo dia e horário (Lei nº 9.504/1997, art. 39, § 1º).

Este Regional, respondendo à Consulta formulada pelo Ministério Público Eleitoral, assim se manifestou:

Considerando o teor da previsão do art. 1º, § 3º, inciso VI, da Emenda Constitucional nº 107/2020 e o disposto no art. 7º, § 1º, da Resolução TSE nº 23.623/2020, os atos de propaganda eleitoral de natureza externa ou intrapartidária que gerem aglomeração de pessoas (como comícios, carreatas, passeatas, caminhadas, reuniões, panfletagem, distribuição e afixação de adesivos, entre outros); os atos do período conhecido como pré-campanha, referidos no art. 36-A da Lei nº 9.504/97, e a realização de convenções partidárias presenciais são permitidos, salvo se desatenderem às normas sanitárias vigentes, amparadas em prévio parecer técnico emitido por autoridades sanitárias da União e do Estado da Paraíba, em virtude da pandemia causada pelo novo coronavírus (COVID-19), a exemplo da Lei Federal nº 13.979/2020 e do Decreto Estadual nº 40.304/2020.

Sobreleva ressaltar que a Nota Técnica acima transcrita de fato recomenda a não realização de atos presenciais genericamente em todos os 223 municípios do Estado.

Analisando teor da 8ª Nota Técnica, expedida pela Secretaria de Estado da Saúde3, verifico ter sido atribuída a classificação BANDEIRA AMARELA ao município de Remígio.

Com efeito, na referida localidade, de acordo com as premissas do Plano Novo Normal Paraíba4, tem-se estabelecida a restrição ao funcionamento de atividades que representam maior risco para o controle da pandemia.

Destaco que, entre as principais diretrizes constantes do mencionado Plano, consta a seguinte:

“DEVEREMOS EVITAR:
CONTATO ENTRE PESSOAS – (Usar Máscaras, higiene mãos, distância de 1,5m, sem abraços, apertos de mão.) – Qualquer conversa cara a cara de 15 minutos entre pessoas que estão a um metro e meio de distância constitui um contato próximo.

CONFINAMENTO (LOCAIS FECHADOS) – Quando há ar estagnado, as gotículas podem persistir por mais tempo, e haverá muita contaminação nas superfícies;

AGLOMERAÇÕES – Grupos grandes são arriscados, não importa onde estejam reunidos. Mesmo ao ar livre, multidões significam mais pessoas, mais contatos – e mais fontes potenciais de infecção.”

Cabe, então, o seguinte questionamento: comícios, passeatas e carreatas, cuja realização envolve precipuamente aglomeração de pessoas, configuram-se como atividades que representam maior risco para o controle da pandemia?
Percebe-se um conflito aparente de normas, uma vez que preceitos legais se contrapõem diante de situações fáticas postas à análise jurídica.

De um lado, tem-se o direito à liberdade de expressão eleitoral e, por conseguinte, os atos de campanha e a propaganda de Coligações, Partidos e Candidatos, de outro, tem-se o direito à saúde, à vida e à segurança sanitária de toda uma comunidade.
Desse modo, impõe-se ao intérprete realizar um sopesamento de valores, um juízo de proporcionalidade na análise dos princípios e sistemática jurídica postos em discussão.

O estudo dos textos normativos transcritos acima revela que, diante da crise sanitária decorrente da Pandemia (Covid 19), os atos de propaganda eleitoral que são autorizados pela legislação eleitoral, como comícios e carreatas, poderão ser restringidos por normas estaduais e federais voltadas especificamente ao combate à pandemia, tais como a proibição de aglomerações e lockdown, com fundamento em recomendações das autoridades sanitárias.

No exercício do juízo de proporcionalidade, é necessário priorizar as garantias atinentes à saúde e incolumidade dos cidadãos, seguindo-se as orientações científicas e técnicas dos órgãos competentes, sem que se pretenda vedar desarrazoadamente os atos de campanha eleitoral tão importantes ao exercício da democracia.

Não é possível admitir que os participantes do Pleito Eleitoral de 2020 desconheçam a realidade inusitada e completamente adversa por que passam os municípios, estados e países no mundo inteiro.

Vive-se uma crise sanitária sem precedentes, que já alcançou marcas inimagináveis de mortos em poucos meses.

Ainda assim, em nome da manutenção do nosso Estado Democrático de Direito, o Congresso Nacional editou norma específica para propiciar a realização das eleições que, nada obstante, devem ser efetivadas dentro de novos padrões e cuidados, impondo-se restrições e revisões de condutas para todos, sejam partidos, candidatos, coligações, eleitores, forças de segurança, e também para Justiça Eleitoral.

Entendo que é preciso um esforço conjunto para que se garanta a realização das eleições com o menor risco à saúde de todos os envolvidos.

Neste prisma, o principal impacto da pandemia (Covid 19) sobre as campanhas eleitorais diz respeito à realização de atos que importem em contato físico entre as pessoas e foi exatamente o que o Ato Impugnado buscou evitar.

Aliás, consta do Protocolo de Segurança elaborado pela SES5 para as Eleições 2020 ser atribuição dos candidatos:

“Contribuir para a normalidade do pleito, segurança do voto e liberdade democrática em observância ao cumprimento das medidas higiênicos sanitárias que minimizem os ricos à saúde pública durante todos os trâmites do processo eleitoral, especialmente, durante o período das Campanhas Eleitorais e no dia das Eleições Municipais de 2020;
…Evitar eventos que ocasionem grandes aglomerações de pessoas, como comício, caminhadas, carreatas, reuniões com grande número de pessoas e que seja mais difícil o controle de distanciamento social;…”

Cabe destacar que as medidas restritivas constantes do Ato Impugnado têm caráter geral e valem para todas as Coligações, Partidos e Candidatos em disputa, não havendo distinções entre quaisquer deles.

Nessa vertente, devo lembrar que não há desprestígio à liberdade de expressão e nem à a propaganda eleitoral, porém o cenário atual exige a responsabilidade não apenas da Justiça Eleitoral, mas especialmente dos partícipes do processo, que podem se valer do uso da internet, das redes sociais, dos guias/inserções eleitorais, assim como de eventos virtuais para ampliar o diálogo democrático, a divulgação de propostas e também discussão de projetos pelos candidatos e eleitores, objetivando compatibilizar as campanhas com o momento de pandemia vivenciado atualmente.

Com efeito, neste juízo de cognição sumária para concessão de medida liminar, embora reconheça a relevância da plausibilidade do direito invocado, entendo pertinente apenas a modulação parcial da Decisão combatida.

Quanto ao perigo de dano irreparável ou de difícil reparação, também verifico presente.
Neste aspecto, lembro que o processo eleitoral, diante das reformas havidas na Lei das Eleições, deixou de ser um microprocesso para se transformar em nano, conforme já declinei em julgado anterior. Desse modo, iniciado o período permissivo para propaganda eleitoral em 27 de setembro, com a referida Portaria baixada e em vigor, evidencia-se o segundo requisito.

Isso posto, com fundamento no artigo 7º, III da Lei nº 12.016/2009, DEFIRO PARCIALMENTE A LIMINAR para permitir a realização de reuniões políticas cujo número de participantes fica adstrito ao que o ambiente ensejar com a garantia do distanciamento social recomendado, mantidas as demais proibições.

Registro, por importante, que a concessão parcial da liminar não implica no desatendimento às medidas sanitárias de proteção definidas pelos órgãos e autoridades competentes, além de todas as demais cautelas exigidas nos protocolos municipais e estaduais de prevenção à contaminação pelo COVID-19, a exemplo da utilização de ambientes que garantam o distanciamento social com espaço mínimo e privativo de 2m² por pessoa, com controle de acesso, devendo ser fornecido/ exigido todo o aparato de higienização, bem como uso de máscaras por todos os participantes, com vistas à preservação da saúde de todos os envolvidos e da população em geral.

Notifique-se a Impetrada para prestar informações no prazo de 10 (dez) dias, na forma do art. 7º, I, da Lei nº 12.016/2009.

Dê-se ciência à Advocacia-Geral da União na Paraíba, para, querendo, ingressar no feito, nos moldes do art. 7°, II, do mesmo diploma.

Após o decênio legal, vista ao MPE.

Publique-se. Intime-se. Cumpra-se.

Providências a cargo da Secretaria Judiciária.

João Pessoa, data constante na assinatura eletrônica.

Des. JOÁS DE BRITO PEREIRA FILHO
Relator

 

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