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TJ envia caso de censura ao Maranhão

Os desembargadores da 5ª Turma Cível do Tribunal de Justiça do Distrito Federal decidiram ontem manter o Estado sob censura. Depois de ter tomado três decisões a respeito da proibição requerida pelo empresário Fernando Sarney, o TJ-DF determinou que o caso seja transferido para a Justiça Federal Cível de primeira instância no Maranhão. Os juízes consideraram que o tribunal de Brasília não é foro competente para julgar o assunto.

Fernando, filho do presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), conseguiu há 62 dias uma liminar do desembargador Dácio Vieira que proíbe o jornal de noticiar as investigações da Polícia Federal na Operação Boi Barrica. O empresário, responsável por dirigir os negócios da família do parlamentar, está sob investigação há quase três anos.

A operação, depois desdobrada em cinco inquéritos, mapeou transações financeiras suspeitas das empresas do grupo, detectadas às vésperas da eleição de 2006. Em julho, ao final de quase seis horas de depoimento na Superintendência da PF do Maranhão, em São Luís, o empresário foi indiciado por lavagem de dinheiro, tráfico de influência, formação de quadrilha e falsidade ideológica.

O nome da operação, alusivo ao grupo folclórico maranhense que tem os Sarney como patronos, foi modificado depois para Faktor. É uma referência a uma factoring, descoberta no início das investigações da Polícia Federal, que movimentou R$ 40 milhões em cinco anos.

SUSPEIÇÃO

No julgamento de ontem, a portas fechadas – assistido apenas pelos advogados do jornal -, os desembargadores da 5ª Turma concluíram que o Tribunal de Justiça do DF não era competente para julgar o caso, porque as decisões sobre a Operação Boi Barrica foram tomadas pela Justiça maranhense.

Apesar de terem chegado a essa conclusão, os juízes mantiveram a liminar que instaurou a censura, em decisão criticada por juristas e entidades de defesa da liberdade de imprensa. Em sessão anterior, os desembargadores já haviam decidido afastar Vieira do caso. Os advogados do Estado sustentaram que o desembargador não era mais isento para relatar o processo porque atribuíra ao jornal “ação orquestrada mediante acirrada campanha com o nítido propósito de intimidação”.

O desembargador criticou o jornal justamente ao rejeitar um primeiro recurso, no qual o Estado sustentava que ele não poderia atuar no caso, pois tinha relações com os Sarney. Reportagem publicada em agosto mostrou que Vieira era do convívio social da família do senador e do ex-diretor-geral do Senado Agaciel Maia.

O TJ não reconheceu a parcialidade invocada pela intimidade do magistrado com Sarney. Mas, depois de o jornal protocolar o segundo recurso, o tribunal reconheceu que o desembargador havia perdido a isenção com as críticas feitas ao Estado.

Maurício Azêdo
Presidente da ABI

“É mais uma demonstração do corporativismo que retarda a solução e prolonga uma inconstitucionalidade absurda. Estamos diante de um absurdo só comparável àqueles cometidos na ditadura”

Rosângela Giembinsky
Voto Consciente

“Não tem explicação uma situação dessas. O que esses caras estão querendo? É inadmissível. O Voto Consciente sente uma indignação. Não podemos mais confiar na Justiça, é preciso um controle externo”

Mozart Valadares
Presidente da AMB

“O que mais me espanta, me deixa surpreso, é quando um tribunal diz que não tem competência e mantém a decisão. Se é incompetente, a decisão está revogada. Não consigo entender”

Márlon Reis
Juiz, membro do MCCE

“O Judiciário não pode realizar censura prévia, ofende claramente a Constituição. Pode ter chegado o momento de o STF ser estimulado a editar uma súmula vinculante. OAB e ANJ deveriam provocar o Supremo”

José Carlos Cosenzo
Presidente do Conamp

“Se o juiz foi declarado incompetente, a decisão não tem valor. O TJ-DF é competente, a meu ver, já que todos os fatos se deram em Brasília. O jornal deve fazer representação ao CNJ e à Corregedoria Nacional de Justiça”

Rubens Figueiredo
Cientista político

“É uma decisão medieval, em pleno século 21. Parece que estamos dando sempre passos para trás em nossa democracia. É como se fosse um dinossauro, um pterodáctilo sobrevoando nosso mundo”

Marina Person
Cineasta e apresentadora

“É uma coisa tão absurda, um contrassenso inaceitável. Fica até difícil não chover no molhado. O que está acontecendo lá é com dinheiro nosso, então nada mais apropriado que a gente possa saber o que está acontecendo”

Ricardo Pedreira
Diretor executivo da ANJ

“A ANJ expressa seu repúdio e estranheza pela decisão da 5.ª Turma Cível do TJ-DF de se declarar incompetente para julgar a ação e manter a liminar do desembargador Dácio Vieira, que é totalmente inconstitucional”

Cézar Britto
Presidente da OAB

“A censura prévia não foi agasalhada pela Constituição brasileira. As instituições da liberdade só podem ser aquelas previstas no texto constitucional. Não está incluída a censura. Ela é vedada expressamente”

Cláudio Abramo
Transparência Brasil

“É insanidade, não faz nenhum sentido. Estão brincando com o jornal. Eu diria que esse é o sinal de uma Justiça esquizofrênica. Não me admira que as pessoas considerem o Judiciário incompetente”

Ana Moser
Ex-jogadora de vôlei

“É mais um sinal, um retrato do Brasil. Há bons retratos, mas outros muito feios, de abuso de poder. É uma continuidade do poder na mão de pequenos grupos. Isso é o que atrasa o Brasil em pleno século 21”

Henrique Calandra
Desembargador

“O desgaste provocado pela liminar é tão grande que em outras ocasiões a parte desse mesmo tipo de liminar cedeu. Este é um bom momento para que a polêmica seja enfim encerrada”

Leonardo Barreto
Cientista político

“A decisão do TJ conseguiu ser mais antidemocrática que a do desembargador, porque ela sepulta a possibilidade de revogação da liminar e envia a decisão para a casa do adversário”

Beatriz Segall
Atriz

“O que é que está acontecendo? Por que a Justiça brasileira tem tanto medo de acabar com essa vergonha? Onde já se viu um tribunal se declarar incompetente depois de 61 dias. Tenho náuseas de saber que essas coisas podem acontecer no meu País”
 

 

Estadão

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